a rescisão indireta é o “pedido de demissão por culpa do empregador”. Quando a empresa pratica falta grave, o empregado pode pedir que o Judiciário reconheça a ruptura do contrato por culpa patronal e, com isso, receba praticamente as mesmas verbas de uma dispensa sem justa causa (aviso-prévio, 13º proporcional, férias + 1/3, multa de 40% do FGTS, liberação do saque e habilitação no seguro-desemprego), desde que prove os fatos e demonstre que a situação tornou a continuidade do vínculo insustentável. O caminho seguro é reunir provas, agir com estratégia e ingressar com ação trabalhista pedindo a rescisão indireta e as verbas correspondentes.

O que é rescisão indireta e qual é sua base jurídica

Rescisão indireta é a resolução do contrato de trabalho por falta grave do empregador. Trata-se do espelho da justa causa do empregado: em vez de o empregador punir o trabalhador, é o trabalhador que, diante de conduta reprovável da empresa, pede ao Judiciário que declare o fim do contrato por culpa do empregador.

A Consolidação das Leis do Trabalho lista hipóteses típicas que autorizam essa medida. Em linguagem simples, a lei reconhece que o contrato de trabalho exige confiança, respeito e cumprimento de obrigações mínimas. Rompida essa base por ato patronal grave, não se pode exigir que o empregado continue no emprego.

Em termos práticos, a rescisão indireta exige três pilares: um fato grave praticado pelo empregador, a prova desse fato e o nexo entre o fato e a impossibilidade de continuidade do contrato. Quando esses elementos estão presentes, a Justiça do Trabalho costuma equiparar os efeitos financeiros à dispensa imotivada.

Hipóteses clássicas que autorizam a rescisão indireta, com exemplos

As situações abaixo são as mais reconhecidas pela jurisprudência para caracterizar a rescisão indireta. Veja exemplos concretos de cada uma:

  1. Descumprimento das obrigações contratuais
    O empregador deve pagar salários em dia, recolher FGTS, registrar o contrato, fornecer recibos, respeitar jornada e concessão de férias. Descumprimentos reiterados configuram falta grave.
    Exemplos: atraso frequente de salários; pagamento “por fora” sem registro; ausência de recolhimento de FGTS por longo período; não concessão de férias dentro do prazo legal; supressão injustificada de adicional noturno, de insalubridade ou periculosidade quando devido; não pagamento habitual de horas extras prestadas.

  2. Exigência de serviços superiores às forças, proibidos por lei, contrários aos bons costumes ou alheios ao contrato
    O empregador não pode impor tarefas perigosas sem proteção, ilícitas ou totalmente estranhas ao cargo contratado.
    Exemplos: mandar balconista dirigir caminhão sem habilitação; exigir do empregado operação de máquina sem treinamento; determinar que a pessoa faça “bicos” privados do patrão dentro do expediente.

  3. Tratamento com rigor excessivo e assédio (moral ou sexual)
    A empresa e seus prepostos devem respeitar a dignidade do empregado. Rigor excessivo, humilhações, xingamentos, metas abusivas com exposição vexatória e assédio sexual configuram falta gravíssima.
    Exemplos: reuniões com “ranking da vergonha”; apelidos pejorativos reiterados; cobranças com gritos; condicionamento de benefícios a favores íntimos; mensagens íntimas inoportunas de superior hierárquico.

  4. Perigo manifesto de mal considerável e ambiente inseguro
    A empresa deve garantir condições adequadas de saúde e segurança. Expor o empregado a risco relevante, sem prevenção, autoriza a ruptura.
    Exemplos: ausência de EPIs em atividades perigosas; máquinas sem proteção; armazenamento irregular de inflamáveis; ordens para trabalhar em altura sem treinamento nem cinto; descumprimento sistemático de normas de segurança.

  5. Ato lesivo à honra e boa fama do empregado ou de seus familiares
    Ofensas à reputação, calúnias, acusações infundadas de furto e difamações públicas caracterizam falta grave.
    Exemplos: espalhar boatos sobre a vida íntima do empregado; acusar sem provas de desviar mercadorias; postar ofensas em comunicados internos.

  6. Agressão física por empregador ou preposto (salvo legítima defesa)
    Qualquer violência física no ambiente de trabalho é intolerável.
    Exemplos: empurrões, tapas, agressão durante discussão; “segurar” o empregado com força para impedi-lo de sair.

  7. Redução dolosa do trabalho por peça ou tarefa para diminuir salários
    Em remuneração por produção, reduzir artificialmente as condições de produção para pagar menos é falta grave.
    Exemplos: mudar a régua de metas sem base técnica para reduzir ganhos; reter insumos de forma a derrubar produção e salário.

Essas hipóteses não formam um rol exaustivo. A jurisprudência tem reconhecido novas configurações de falta grave, como o teletrabalho sem reembolso de despesas essenciais, a hiperconectividade com exigência de disponibilidade permanente fora do expediente e a implantação de metas inatingíveis com ameaças veladas de demissão.

Diferenças entre rescisão indireta, pedido de demissão e justa causa do empregado

É comum confundir as figuras. Abaixo, as distinções essenciais:

Pedido de demissão: vontade do empregado de sair sem culpa patronal. O trabalhador não tem direito a multa de 40% do FGTS, não pode sacar o FGTS e não tem seguro-desemprego. Em regra, deve cumprir aviso-prévio ou indenizá-lo.

Justa causa do empregado: penalidade aplicada pelo empregador ao trabalhador que comete falta grave (ex.: desídia, insubordinação, ato de improbidade, abandono de emprego). O empregado perde várias verbas, recebe apenas saldo de salário e férias vencidas + 1/3.

Rescisão indireta: quem rompe é o Judiciário, por culpa do empregador. O empregado tem direito às verbas típicas da dispensa sem justa causa, incluindo multa do FGTS e seguro-desemprego, desde que preenchidos os requisitos legais.

Direitos e verbas devidas quando a rescisão indireta é reconhecida

Quando o juiz reconhece a rescisão indireta, os efeitos costumam ser os mesmos da dispensa imotivada, com as particularidades do caso. Em regra, são devidos:

Saldo de salário
Aviso-prévio indenizado (projetando tempo de serviço para outros cálculos)
13º salário proporcional
Férias vencidas (se houver) e férias proporcionais, ambos acrescidos de 1/3
Multa de 40% sobre o saldo do FGTS
Liberação do saque do FGTS
Guia para habilitação no seguro-desemprego (se preenchidos os requisitos)
Multas e penalidades por atraso no pagamento rescisório, quando cabíveis
Reflexos de adicionais e horas extras, se reconhecidos

A data da rescisão normalmente é fixada na decisão, considerando as circunstâncias do caso e eventual projeção do aviso-prévio. Se o juiz entender que o contrato se rompeu na data do ajuizamento ou de determinado fato grave, isso repercute em cálculos e prazos.

Provas: como demonstrar a falta grave do empregador

A prova é o coração da rescisão indireta. Cabe ao empregado demonstrar, com robustez, a falha patronal. São úteis:

Documentos: contracheques, recibos, extratos do FGTS, comunicações internas, advertências injustificadas, e-mails, prints de aplicativos, metas, atas, laudos de segurança, PPP e ordens de serviço.

Testemunhas: colegas que presenciaram humilhações, cobranças abusivas, atrasos de pagamentos, supressão de pausas, falhas de segurança.

Perícias: quando a questão envolve saúde e segurança, ergonomia, insalubridade/periculosidade ou assédio, a prova técnica pode ser relevante.

Gravações ambientais: a gravação de conversa da qual a própria parte participa, sem ciência do interlocutor, tende a ser admitida como prova lícita. A gravação de terceiros, sem participação, é controvertida.

Mensageria corporativa: conversas em grupos de trabalho, desde que autênticas e com contexto, ajudam a demonstrar assédio e imposições anormais de metas.

Boletins de ocorrência e CAT: em casos de violência física ou acidentes, reforçam o contexto.

A organização cronológica dos fatos, com datas, horários, nomes e locais, aumenta a credibilidade e facilita a compreensão judicial. Sempre que possível, construa uma linha do tempo.

Posso parar de trabalhar enquanto peço rescisão indireta?

Essa é uma das dúvidas mais sensíveis. Em tese, enquanto o contrato não é rompido por decisão judicial, a relação segue vigente. Em muitas situações, a orientação prudente é continuar prestando serviços até que o juiz reconheça a rescisão indireta, sob pena de a empresa tentar caracterizar abandono de emprego ou transformar o pedido em demissão voluntária.

Contudo, há hipóteses em que a permanência é inviável ou perigosa, como atrasos salariais reiterados que inviabilizam a subsistência, assédio intenso ou risco grave à saúde e à integridade física. Nesses cenários, é razoável ingressar com ação, pedir tutela de urgência para o reconhecimento imediato da rescisão e, motivadamente, cessar a prestação. O êxito dessa estratégia depende da força da prova inicial e da urgência demonstrada. Por isso, o planejamento probatório é decisivo.

Passo a passo estratégico para pedir a rescisão indireta

  1. Diagnóstico jurídico: identifique com precisão a falta patronal (ou o conjunto de faltas). Nem toda irregularidade autoriza a medida. Exige gravidade e reiteração ou impacto sensível.

  2. Dossiê probatório: reúna contracheques, extratos do FGTS, mensagens, e-mails, meta e resultado, laudos, fotos, gravações, atestados, comunicações do RH. Providencie testemunhas dispostas a depor.

  3. Notificação e registro dos fatos: formalize por escrito reclamações internas, protocolos no RH, comunicações ao sindicato, CIPA ou canal de ética. Esses registros contam a história no papel.

  4. Ação trabalhista: ajuíze a ação pedindo a rescisão indireta, especificando os fatos, a base legal, as verbas, a data de ruptura e, se for o caso, tutela de urgência. Peça a entrega das guias do seguro-desemprego e a liberação do FGTS.

  5. Audiência e instrução: apresente suas testemunhas, sustente a coerência da narrativa e a gravidade dos fatos. Requeira a produção de prova pericial quando a matéria envolver saúde e segurança.

  6. Liquidação e execução: após a sentença, calcule as verbas e promova a execução. Em caso de homologação de acordo, confira cláusulas e prazos.

Situações modernas que vêm gerando rescisão indireta

Assédio por metas e hiperconectividade: exigir disponibilidade permanente em aplicativos fora do expediente, impor metas inatingíveis sob ameaça, monitorar obsessivamente o status online e convocar reuniões fora do horário, sem compensação, têm sido reprovados.

Teletrabalho sem suporte: fazer o empregado arcar com internet, energia, mobiliário ergonômico e equipamentos essenciais, sem reembolso e sem orientação de ergonomia, acumulado com cobranças, pode configurar descumprimento contratual.

Controle abusivo de pausas: proibir idas ao banheiro, estabelecer “cronometragem humilhante” de pausas ou bloquear água no posto de trabalho toca em dignidade e saúde.

Fraudes salariais: pagar parte “por fora”, manter salário inferior ao piso, sonegar adicionais e não registrar o vínculo são descumprimentos graves.

Ambiente discriminatório: piadas sobre raça, gênero, idade, orientação sexual, religião ou condição de saúde, toleradas pela empresa, constituem falta gravíssima.

Estabilidades e rescisão indireta: gestante, acidentado, cipeiro e outros

O reconhecimento da rescisão indireta não elimina estabilidades legais; ao contrário, converte-as em indenização substitutiva. Exemplos:

Gestante: a estabilidade do início da gravidez até cinco meses após o parto gera indenização do período restante, além das verbas rescisórias.

Acidentado/doença ocupacional: durante o período estabilitário, a indenização substitui a reintegração, caso a rescisão indireta seja reconhecida por culpa patronal relacionada ao adoecimento ou às condições de trabalho.

Membro da CIPA: a estabilidade do cipeiro também é passível de indenização substitutiva quando a rescisão ocorre por falta grave do empregador.

Essas indenizações somam-se às demais verbas.

Emprego doméstico, aprendiz, terceirizado e estagiário

Doméstico: aplicam-se, por analogia, as causas de ruptura por falta patronal. A falta grave do empregador pessoa física (ex.: assédio, atraso reiterado de salário, moradia insegura no trabalho interno) autoriza a rescisão indireta com verbas típicas do emprego doméstico.

Aprendiz: o contrato de aprendizagem segue regras da CLT e pode ser rescindido por falta grave patronal. Em caso de assédio ou descumprimento do programa formativo, é possível pleitear a rescisão indireta.

Terceirizado: se a tomadora expõe o trabalhador a condições degradantes, sem que a empregadora regularize, a responsabilidade subsidiária pode alcançar as verbas reconhecidas com a rescisão indireta. Documente a cadeia contratual e a subordinação.

Estagiário: o estágio não cria vínculo de emprego quando regular. Irregularidades que descaracterizam o estágio podem levar ao reconhecimento de vínculo e, aí sim, à análise da rescisão indireta como empregado.

Alteração contratual lesiva, transferência abusiva e rebaixamento

Mudanças unilaterais que reduzam salário, rebaixem função, alterem jornada de forma prejudicial, imponham transferência sem necessidade real do serviço ou sem previsão contratual podem configurar falta grave. O chamado ius variandi tem limites. Se a alteração impacta de modo sensível a vida do empregado (tempo de deslocamento, custos, saúde), e não há justificativa empresarial séria, a violação se torna relevante.

Saúde, segurança, EPIs e programas obrigatórios

O dever de segurança patronal não se cumpre com papel. É preciso efetividade: EPIs adequados e substituídos, treinamentos periódicos, avaliações ergonômicas, ordens de serviço claras e controle real dos riscos. A negligência reiterada nessa área, com exposição a agentes nocivos, sobrecarga física e mental ou acidentes recorrentes, tem sido motivo frequente de rescisão indireta e de condenações por dano moral e material.

Convenções e acordos coletivos: força normativa e descumprimento

Cláusulas coletivas integram o contrato de trabalho. O descumprimento contumaz de piso salarial, tíquete alimentação, adicional normativo, jornada diferenciada, pausas específicas ou estabilidade prevista em ACT/CCT é descumprimento contratual relevante. Tenha em mãos as convenções aplicáveis e destaque os itens violados.

Prazos e prescrição: quando ajuizar a ação

A ação de rescisão indireta pode ser ajuizada durante a vigência do contrato, sempre que a falta grave se tornar presente e atual. Reconhecida a rescisão, passam a valer as regras gerais de prescrição trabalhista para cobrança de parcelas: até dois anos após a extinção do contrato para propor ação, alcançando os últimos cinco anos de parcelas devidas. Em prazo, o melhor conselho é agir cedo: fatos antigos sem continuidade tendem a perder força probatória.

Riscos e cuidados: quando a Justiça não reconhece a rescisão indireta

Nem toda irregularidade justifica a medida extrema. Faltas pontuais, equívocos corrigidos, atrasos esporádicos sem repercussão relevante ou atos isolados sem gravidade usualmente não bastam. Se o juiz entender que não houve falta grave, o pedido pode ser convertido em pedido de demissão, com perda de verbas como a multa de 40% do FGTS e o seguro-desemprego. Por isso, é vital calibrar o caso, fortalecer a prova e avaliar alternativas, como a tentativa de acordo ou o pedido de rescisão por comum acordo, quando fizer sentido.

Cálculo das verbas e projeções do aviso-prévio

O aviso-prévio indenizado projeta tempo de serviço, impactando 13º e férias proporcionais. Em contratos longos, a projeção pode alcançar até 90 dias, conforme o tempo de casa. Essa projeção altera a base de cálculo de algumas parcelas e pode postergar a data-base para fins de prescrição das verbas anteriores. Em ações de rescisão indireta, é comum discutir também diferenças de adicionais, integrações, reflexos e multas pelo atraso no pagamento rescisório.

Dano moral e material cumulados

Se a falta patronal causar abalo psicológico, humilhação, exposição indevida ou dor real, é cabível pleitear indenização por dano moral, cumulada com a rescisão indireta. Se houver perda econômica específica (tratamento psicológico, custos médicos, perda de oportunidade), avalie o dano material. Em doenças ocupacionais, discute-se pensão, custeio de tratamento e estabilidade.

Checklist de documentos úteis

Identidade, CTPS e contrato de trabalho
Contracheques, recibos, cartões de ponto, relatórios de jornada
Extratos do FGTS e comprovantes de ausência de depósitos
Mensagens, e-mails, circulares, atas de reunião, metas e relatórios de performance
Comunicações ao RH, CIPA, sindicato ou canal de ética
Laudos, atestados médicos, CAT, prontuários de SESMT, PPRA/PGR, PCMSO, ordens de serviço
Fotos e vídeos do ambiente de trabalho, EPIs, máquinas
Indicação de testemunhas com nome completo e função

Tabela comparativa: direitos em cada modalidade de ruptura

ItensRescisão indireta (culpa do empregador)Dispensa sem justa causaPedido de demissãoJusta causa do empregado
Saldo de salárioSimSimSimSim
Aviso-prévioIndenizadoIndenizado ou trabalhadoDevido pelo empregado (trabalhar ou indenizar)Não
13º proporcionalSimSimSimNão
Férias proporcionais + 1/3SimSimSimNão
Férias vencidas + 1/3SimSimSimSim
Multa de 40% do FGTSSimSimNãoNão
Saque do FGTSSimSimNãoNão
Seguro-desempregoSim (se requisitos)Sim (se requisitos)NãoNão
Estabilidades legais (indenização)SimNão aplicávelNãoNão
Dano moral/materialSe comprovadoSe comprovadoNãoNão

Exemplos práticos de decisões típicas

Atraso salarial reiterado e não recolhimento de FGTS por longo período: reconhecimento da rescisão indireta, pagamento de todas as verbas, liberação do FGTS com multa e habilitação no seguro-desemprego.

Assédio moral por metas abusivas e humilhações públicas, com provas documentais e testemunhais: rescisão indireta reconhecida e condenação por dano moral, além das verbas rescisórias.

Ambiente inseguro com acidentes recorrentes, ausência de EPIs e treinamentos: rescisão indireta declarada, com adicionais de insalubridade/periculosidade, verbas rescisórias e, em alguns casos, indenizações por danos.

Transferência abusiva para cidade distante, sem justificativa e com prejuízo evidente: rescisão indireta reconhecida por alteração contratual lesiva, com verbas integrais.

Boas práticas antes de judicializar

Registrar tudo por escrito e guardar provas
Evitar reações impulsivas e discussões acaloradas
Procurar orientação técnica para dimensionar riscos e estratégias
Avaliar pedido de tutela de urgência quando a permanência no posto for insustentável
Manter conduta profissional até o último dia, inclusive para não fragilizar a sua prova

Erros que enfraquecem o pedido

Fatos graves sem prova mínima
Contradições na narrativa ou versões variáveis ao longo do tempo
Testemunhas impreparadas ou com interesse direto
Mensagens editadas sem metadados ou prints isolados sem contexto
Confundir atraso pontual com atraso reiterado e contumaz
Misturar fatos antigos já sanados com fatos novos e relevantes, sem distinguir

Rescisão indireta no teletrabalho e no modelo híbrido

O teletrabalho ampliou conflitos sobre controle de jornada, reembolso de despesas, ergonomia e disponibilidade fora do expediente. Exemplos de faltas graves no contexto remoto:

Impor metas incompatíveis com a jornada legal e exigir respostas imediatas fora do horário, sem compensação;
Transferir ao empregado todos os custos de internet, energia e equipamentos, sem previsão e sem reembolso;
Negar auxílio ergonômico mínimo e ignorar recomendações médicas;
Monitorar a câmera continuamente, sem necessidade, com exposição indevida do ambiente familiar.

Cada uma dessas práticas pode, isoladamente ou em conjunto, caracterizar descumprimento contratual relevante, especialmente quando há reiteração e prova.

Como ficam as verbas quando há estabilidade gestacional ou acidentária

No reconhecimento de rescisão indireta, a jurisprudência tem assegurado indenização substitutiva correspondente ao período estabilitário remanescente, além das verbas normais. Exemplo prático: gestante com mais quatro meses de estabilidade pela frente terá reconhecido o pagamento das parcelas salariais relativas ao período, com reflexos.

Compatibilidade com pedido de danos por assédio

É possível cumular o pedido de rescisão indireta com indenização por assédio moral ou sexual, desde que se delimite claramente a causa de pedir e se apresente prova do dano, do nexo causal e da culpa patronal. Em assédio sexual, a pronta reação, a preservação das mensagens e a busca por canais internos de denúncia costumam fortalecer o caso.

Perguntas e respostas

Posso simplesmente parar de ir trabalhar e depois entrar com a ação?
Não é recomendável. Como regra, continue no posto até decisão judicial, a menos que a permanência seja inviável ou perigosa. Nesses casos, leve ao juiz um pedido de urgência muito bem documentado.

A empresa atrasa o salário um ou dois dias às vezes. Isso já dá rescisão indireta?
Atrasos pontuais, isolados e rapidamente sanados, sem repercussão concreta, geralmente não bastam. O que caracteriza a falta grave é a reiteração, a contumácia ou o impacto sensível na subsistência do empregado.

FGTS não recolhido sempre gera rescisão indireta?
O não recolhimento prolongado, reiterado e sem justificativa é forte indicativo de descumprimento contratual grave, especialmente se combinado com outros vícios. Comprove a extensão e a habitualidade da falta.

Assédio moral tem que ser diário para caracterizar?
Não. A reiteração ajuda, mas atos isolados de grande gravidade, humilhações públicas contundentes ou ofensas graves também podem fundamentar a ruptura. Guarde provas e busque testemunhas.

Se eu pedir rescisão indireta e perder, viro demissionário?
É possível que o juiz entenda que o contrato se extinguiu por sua iniciativa, sem culpa patronal, com efeitos de pedido de demissão. Por isso, a análise prévia de risco e a robustez da prova são essenciais.

Tenho estabilidade (gestante/cipeiro). Perco se pedir rescisão indireta?
Não. Em regra, o reconhecimento da rescisão indireta converte a estabilidade em indenização substitutiva pelo período restante.

Posso ter seguro-desemprego após a rescisão indireta?
Sim, desde que a decisão judicial reconheça a ruptura por culpa patronal e você preencha os requisitos legais de tempo de serviço e ausência de renda.

Trabalho em home office e gasto com internet e energia. A empresa não reembolsa nada. Cabe rescisão indireta?
Se as despesas forem essenciais, habituais e relevantes para a prestação do serviço, e a empresa se recusar a reembolsá-las mesmo após ser informada, pode haver descumprimento contratual. Documente valores, comunicações e impactos.

Meu chefe me empurrou durante uma discussão. Posso pedir rescisão indireta?
A agressão física por superior ou preposto, salvo legítima defesa, é falta gravíssima. Registre ocorrência, guarde provas e avalie o pedido de tutela de urgência.

Sou terceirizado. A tomadora me humilha e a minha empregadora nada faz. E agora?
A responsabilidade pode alcançar a tomadora de serviços, ao menos de forma subsidiária, e a falta grave pode fundamentar a rescisão indireta. Documente a participação de cada empresa.

A empresa pode me transferir para outra cidade da noite para o dia?
Transferência que desorganiza sua vida sem real necessidade de serviço, sem previsão contratual e com ônus desproporcional pode ser alteração lesiva e motivo para rescisão indireta.

Conclusão

A rescisão indireta existe para proteger o empregado quando o empregador rompe a base de confiança do contrato com faltas graves. Ela exige prova firme de condutas que tornem insustentável a continuidade do vínculo, como atrasos reiterados de salário, assédio, ambiente inseguro, fraudes salariais, alterações contratuais lesivas e discriminação. Reconhecida a falta patronal, os efeitos se equiparam aos da dispensa sem justa causa, com direito ao aviso-prévio indenizado, 13º e férias proporcionais, multa de 40% do FGTS, liberação do saque e seguro-desemprego, além de eventual indenização por danos.

O sucesso do pedido depende de estratégia: diagnosticar corretamente a falta, montar um dossiê probatório consistente, registrar comunicações internas, escolher o momento processual adequado e, quando necessário, requerer tutela de urgência. Erros comuns — como agir por impulso, parar de trabalhar sem amparo probatório ou confundir irregularidades pontuais com faltas graves — costumam comprometer o resultado.

Em suma, rescisão indireta não é atalho para sair do emprego; é remédio excepcional para situações em que o empregador, por seus atos, torna inviável a continuidade do contrato. Com técnica, prova e prudência, ela cumpre seu papel: restaurar a justiça na ruptura e assegurar ao trabalhador as verbas e as proteções que lhe são devidas.

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