A “nova regulamentação” do trabalho aos domingos e feriados, que muitos esperavam começar a valer em 1º de julho de 2025, acabou não mudando na prática nessa data: dias antes, o Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) prorrogou a entrada em vigor da Portaria MTE nº 3.665/2023 para 1º de março de 2026. Assim, a partir de julho de 2025 não houve virada de chave obrigando, automaticamente, novas negociações coletivas para funcionamento do comércio em feriados; o cronograma foi postergado. Ainda assim, convém entender o que, afinal, mudará quando a portaria entrar em vigor, o que permanece válido até lá e como empresas e sindicatos devem se preparar.
A Portaria MTE nº 3.665/2023 foi editada para “restabelecer a legalidade” quanto ao trabalho em feriados no comércio, alinhando a regulamentação infralegal ao texto da Lei 10.101/2000 (com a redação dada pela Lei 11.603/2007). Em termos simples, a lei determina que o funcionamento do comércio em feriados depende de autorização em convenção coletiva de trabalho (além da observância da legislação municipal). A portaria retira a autorização automática ampla que constava de atos anteriores e recoloca a negociação coletiva como condição para abrir em feriado.
No fim de 2024, o MTE havia adiado a eficácia da portaria para 1º de julho de 2025, o que levou muitas empresas a se planejarem para negociar com os sindicatos no primeiro semestre de 2025. Porém, em 17 de junho de 2025 o MTE publicou nova prorrogação, deslocando a virada para 1º de março de 2026, com o objetivo declarado de ampliar o tempo para diálogo social e ajustes setoriais.
Em julho de 2025, não entrou em vigor a exigência geral de convenção coletiva para o funcionamento do comércio em feriados prevista na Portaria 3.665/2023; a exigência ficou prorrogada para março de 2026. Até lá, segue valendo o regime anterior, inclusive listas de atividades com autorização permanente e arranjos já pactuados, sem prejuízo de que cada setor possa, por iniciativa própria, negociar condições mais protetivas em instrumentos coletivos.
Importa diferenciar feriados e domingos:
Feriados no comércio
A regra matriz está na Lei 10.101/2000: o trabalho em feriados nas atividades do comércio em geral depende de convenção coletiva e da legislação municipal. A Portaria 3.665/2023 foi concebida para reafirmar essa diretriz, ajustando o rol de autorizações administrativas. Como sua vigência foi postergada, o ponto operacional em julho de 2025 foi: não houve a mudança estrutural anunciada; ela foi adiada para 2026.
Domingos
Domingo não é, por si, feriado. O trabalho dominical é regulado pela CLT e por regulamentações específicas, devendo respeitar o repouso semanal remunerado e os esquemas de revezamento previstos, como o descanso dominical periódico — com proteção reforçada às mulheres, para as quais a jurisprudência continua exigindo revezamento quinzenal que favoreça o repouso aos domingos. Em suma: o trabalho dominical segue admitido em diversos setores, com escalas e compensações, e não foi “proibido” por causa da Portaria 3.665/2023.
Como a pergunta deste artigo mira “o que muda a partir de julho de 2025”, convém expor a essência do modelo que entrará em vigor em 1º de março de 2026, já que ele era a mudança originalmente esperada para julho/25:
Foco em negociação coletiva para feriados no comércio
O trabalho em feriados no comércio deixa de contar com autorizações automáticas amplas e volta a depender de convenção coletiva — instrumento firmado entre o sindicato patronal e o sindicato profissional — respeitada a legislação municipal. Isso desloca a governança para a mesa de negociação setorial, onde poderão ser definidos adicionais, folgas compensatórias, escalas e contrapartidas.
Reclassificação de autorizações
A portaria reordena a lista de atividades com “autorização permanente” para funcionar em feriados, restringindo o espectro de permissões administrativas e remetendo os casos não essenciais à negociação coletiva. Diversos informativos setoriais explicitaram que o comércio em geral volta a precisar de CCT para operar em feriados, com exceções pontuais.
Prevalência de leis municipais
Mesmo com CCT, a abertura em feriados no comércio depende de compatibilidade com a legislação municipal (por exemplo, leis locais que autorizem funcionamento em determinados feriados, ou imponham condições). A leitura combinada de lei federal e normas locais continua sendo imprescindível.
| Tema | Julho de 2025 | A partir de 1º de março de 2026 (Portaria 3.665/2023 vigente) |
|---|---|---|
| Feriados no comércio | Sem a virada geral anunciada; mantém-se o arranjo anterior e os instrumentos coletivos já existentes | Exigência de convenção coletiva para funcionamento em feriados no comércio, com observância da legislação municipal |
| Domingos | Seguem as regras de repouso semanal e escalas; trabalho dominical admitido em vários setores com revezamento e compensação | Mantém-se a lógica de domingos; a portaria foca especialmente nos feriados do comércio |
| Papel da negociação coletiva | Relevante, mas sem a nova obrigatoriedade generalizada para feriados do comércio desde julho/25 | Central: sem CCT, comércio em geral não funciona em feriados |
| Autorizações administrativas amplas | Continuam até a virada | Reduzidas; prevalece a negociação coletiva e a lei |
| Risco de autuação por feriado sem CCT | Avaliado conforme regime ainda vigente e normas locais | Elevado: feriado no comércio sem CCT e sem respaldo municipal configura infração |
É comum confundir “funcionar no domingo” com “abrir no feriado”. Domingo está ligado ao repouso semanal remunerado (preferencialmente nesse dia) e às escalas/regimes que asseguram folga periódica; feriados, por sua vez, têm disciplina própria, e no comércio dependem de autorização coletiva e municipal. A Portaria 3.665/2023 não proíbe trabalho aos domingos; sua ênfase está nos feriados no comércio, recolocando a convenção coletiva como condição. Em julho de 2025, como vimos, essa exigência ainda não se tornou universal por força do adiamento.
A lei federal expressamente cita que o funcionamento do comércio em feriados deve observar a legislação municipal. Isso significa que, mesmo com convenção coletiva autorizando, pode ser necessário cumprir exigências locais (por exemplo, alvarás especiais, horários, ramos específicos). Recomenda-se que empresas mapeiem: (i) a lei do município; (ii) as práticas do órgão de fiscalização local; e (iii) a compatibilidade entre a CCT e a norma municipal.
A proteção específica ao trabalho feminino conserva destaque: decisões e textos de apoio seguem reforçando o revezamento quinzenal que favoreça o repouso dominical das mulheres, devendo a escala ser organizada para que, tendo trabalhado em um domingo, a colaboradora folgue no seguinte. Essa exigência convive com as demais regras gerais sobre repouso e escalas.
Como o regime anunciado para julho/25 foi transferido para março/26, muitas empresas passaram a ter oportunidade de planejamento. Do ponto de vista de governança trabalhista:
Mapeie sua atividade e sua base geográfica
Verifique se sua atividade constará como de autorização permanente ou se dependerá de CCT a partir da virada. Faça a checagem em cada município em que atua, dado o papel das leis locais.
Construa um cronograma de negociação
Mesmo com a prorrogação, não espere a véspera: levante históricos de jornadas, demandas sazonais, custos de adicionais e compensações, e defina objetivos para levar à mesa com o sindicato profissional.
Ajuste escalas e políticas internas
Revise políticas de convocação em feriados, folgas compensatórias, bancos de horas e adicionais. A partir de 2026, a CCT deve refletir e autorizar a operação; internamente, será preciso alinhar RH, jurídico e operações para cumprir o pactuado.
Mensuração de custos
Projeções apontam que a exigência de negociação coletiva pode aumentar custos operacionais (adicionais, benefícios, folgas), mas também reduzir litígios e insegurança jurídica se bem desenhada.
Centralidade da CCT nos feriados
A partir da vigência, categorias terão na CCT o ponto de equilíbrio entre funcionamento e proteção. Cláusulas típicas envolverão adicional por feriado, escalas, limites de jornadas contínuas, transporte e alimentação.
Fiscalização cidadã e institucional
Sem CCT e sem base municipal, a abertura em feriado será irregular. A prorrogação deu tempo para articular campanhas de esclarecimento e canais de denúncia.
Convergência com saúde e segurança
Negociações bem-sucedidas tendem a amarrar contrapartidas organizacionais: dimensionamento de equipes, pausas, intervalos intrajornada e reforço de transporte seguro.
Vários escritórios e entidades setoriais, ainda antes da prorrogação para 2026, explicavam que a partir da vigência: (a) o “comércio em geral” deixaria de ter permissão automática para abrir em feriados; (b) seria necessária CCT para viabilizar a abertura; (c) listas de autorizações administrativas seriam mais enxutas. Embora esses materiais tenham sido publicados tomando julho/25 como marco, a essência permanece — apenas foi deslocada no tempo.
Entre julho/25 e março/26
O risco imediato de autuação por “falta de CCT” no feriado é atenuado pela prorrogação, mas atenção: em muitos locais já havia exigência legal combinada (lei municipal + CCT da categoria). O fato de a Portaria 3.665/2023 estar adiada não “autoriza” desrespeitar a Lei 10.101/2000 nem a lei municipal.
A partir de março/26
Operar em feriado no comércio sem CCT e sem respaldo municipal deve ser tratado como alto risco. Empresas precisam antecipar negociação e alinhar escalas/bancos de horas à CCT para evitar autos de infração, ações civis públicas e passivos (dobras, adicionais e multas).
Clareza de escopo: a CCT deve especificar quais feriados, horários, setores e condições.
Compensação e adicional: explicitar adicional por feriado e folga compensatória (quando aplicável), evitando dupla interpretação.
Equidade de escalas: revezamento justo, especialmente com observância do revezamento quinzenal das mulheres.
Compatibilidade municipal: cláusula afirmando a subordinação à legislação local e eventual adaptabilidade por cidade.
Comitê de acompanhamento: instância paritária para dirimir dúvidas na execução da CCT, reduzindo judicialização.
Levante leis municipais e posições das secretarias locais sobre funcionamento em feriados.
Faça diagnóstico de jornadas, picos de demanda e histórico de litígios.
Consulte a entidade sindical patronal e inicie tratativas com o sindicato profissional.
Modele cenários de custo (adicionais, folgas, transporte, alimentação).
Atualize políticas internas, comunique as equipes e treine gestores para cumprimento da CCT.
Implante sistemas de controle de ponto/escalas coerentes com a nova governança.
O MTE justificou a prorrogação como medida para “ampliar o prazo de negociação” e reafirmar o compromisso com o diálogo social. Para o comércio, a mensagem é dupla: (i) não haverá “canetada” surpresa exigindo CCT sem tempo hábil; e (ii) a direção é inequívoca — feriados no comércio sob a batuta da negociação coletiva. Isso permite que cada segmento construa soluções sob medida, ajustadas à realidade local e setorial.
Em 1º de julho de 2025, minha loja precisava de CCT para abrir no feriado?
A mudança ampla esperada para essa data foi prorrogada; a exigência geral foi deslocada para 1º de março de 2026. Ainda assim, a Lei 10.101/2000 e a legislação municipal já poderiam exigir CCT/localmente antes mesmo da portaria. Verifique sempre o quadro normativo do seu município e a CCT da sua categoria.
Domingos e feriados são a mesma coisa para fins trabalhistas?
Não. Domingo se relaciona ao repouso semanal remunerado e à escala; feriado tem disciplina própria. A Portaria 3.665/2023 trata especialmente dos feriados no comércio.
Como fica o trabalho da mulher aos domingos?
Persistem as regras de revezamento que favoreçam o repouso aos domingos, com reforço jurisprudencial para a escala quinzenal.
Se a portaria está adiada, posso ignorar a lei que exige CCT?
Não. A Lei 10.101/2000, que exige CCT para o comércio em feriados (além da lei municipal), continua vigente e não depende da portaria. A prorrogação apenas posterga o novo desenho infralegal que reorganiza autorizações administrativas.
A partir de quando a mudança passa a valer de fato?
Segundo o MTE, a Portaria 3.665/2023 passa a valer em 1º de março de 2026, por força da Portaria MTE nº 1.066/2025 que adiou a data.
O que devo negociar na CCT?
Adicional por feriado, folga compensatória, limites de jornada nesses dias, escalas equilibradas, transporte, alimentação e mecanismos de solução de dúvidas.
Minha empresa tem unidades em vários municípios: basta uma CCT estadual?
Depende da estrutura sindical e da abrangência de cada CCT. Mesmo com uma CCT ampla, é preciso checar a compatibilidade com cada lei municipal.
E se o sindicato não quiser negociar?
O diálogo sindical é a via central. Entidades patronais podem provocar mediação e buscar cronogramas de negociação com antecedência; o histórico setorial indica que a prorrogação foi justamente para dar tempo a esses arranjos.
Há riscos penais por abrir no feriado sem respaldo?
A irregularidade tem, em regra, consequências administrativas e cíveis-trabalhistas (autos de infração, passivos por adicionais/dobras). A depender do caso, pode haver responsabilização em ações coletivas. O caminho seguro é conformidade preventiva.
Domingo trabalhado dá direito a pagamento em dobro?
O domingo integra o repouso semanal remunerado. A compensação costuma se dar por folga compensatória; quando ela não é concedida, podem surgir passivos por reflexos e diferenças. Feriados exigem atenção extra conforme a CCT e a lei municipal.
A pergunta “o que muda a partir de julho de 2025?” tem uma resposta objetiva: na prática, nada mudou nessa data, porque o MTE adiou a entrada em vigor da Portaria 3.665/2023 para 1º de março de 2026. Mas a direção de política pública está traçada e convém preparar o terreno: o trabalho em feriados no comércio voltará a orbitar a negociação coletiva, com a legislação municipal como coprotagonista. Domingos seguem a lógica do repouso semanal e das escalas, preservadas as garantias específicas — como o revezamento que favorece o descanso dominical das mulheres.
Para empresas, o período entre julho/25 e março/26 é uma janela de compliance inteligente: mapear leis municipais, construir pautas de CCT, estimar custos de adicionais e folgas, revisar políticas internas e treinar gestores. Para sindicatos e trabalhadores, é a chance de estabelecer cláusulas equilibradas que valorizem o descanso, deem previsibilidade às escalas e alinhem contrapartidas razoáveis.
Quando a virada chegar, operar em feriado sem CCT e sem respaldo municipal deixará de ser um detalhe burocrático para se tornar alto risco regulatório e financeiro. O melhor antídoto é a negociação antecipada e transparente, com foco na segurança jurídica e na sustentabilidade econômica do setor. Em suma: julho de 2025 não foi a guinada; foi o aviso para preparar a guinada — e, se o setor usar bem esse tempo, março de 2026 não será um susto, mas o início de um modelo mais claro, negociado e estável.